quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Tietê, Um Clube Agonizante - Por Luiz Domingues



Houve uma época, não tão remota assim, que o rio Tietê, em São Paulo, era sadio e portanto, responsável por diversas atividades esportivas e a oferecer dessa forma, lazer para os paulistanos. Qual família paulistana não possui em suas relações, relatos provenientes de vovôs e bisavôs, com as suas histórias sobre pescarias; natação e esportes aquáticos praticados ali, em momentos de lazer ocorridos outrora ?

Até que iniciasse-se em massa o despejo de dejetos industriais e da rede de esgoto, sem controle algum por parte da prefeitura e do governo estadual, o rio foi limpo e saudável.
E por ter essa utilização aberta à pratica de esportes, motivou a criação de diversos grandes clubes multiesportivos, às suas margens. Dois deles ficaram frente a frente, separados pelo rio e tornaram-se rivais em diversas modalidades : Espéria e Tietê. Por notabilizar-se pela prática de esportes náuticos, principalmente, ambos envolveram-se em acirradas disputas esportivas, ao entrar para a história esportiva da cidade de São Paulo.

Porém, ao longo do tempo, cresceram muito e expandiram-se, ao tornar-se polos esportivos, com diversas modalidades, além do remo e da natação.
No caso específico do Clube de Regatas Tietê, fundado em 1907, foram muitas as glórias esportivas acumuladas por tal agremiação. Muitos atletas formados nas suas quadras e piscinas, representaram o Brasil em jogos Panamericanos; Mundiais e Olimpíadas.
Cito por exemplo, Maria Esther Bueno, a maior tenista brasileira de todos os tempos (campeã em Wimbledon e no US Open, além de vice-campeã em Roland-Garros, ou seja, um vitoriosa no circuito principal do tênis mundial, o dito, Grand Slam), que iniciou a sua carreira no Tietê.
É o caso também da nadadora, Maria Lenk, outra atleta que deu as suas braçadas nas piscinas do Tietê, assim como o decano dos dirigentes esportivos, João Havelange, este, um ex-presidente da CBD (atual CBF); FIFA e membro vitalício do COI. O nadador, Abílio Couto e os corredores, Álvaro Ribeiro e Bento de Camargo Barros também brilharam em suas modalidades. O avô do piloto de Fórmula 1, Ayrton Senna, também foi atleta do C.R. Tietê, o sr. João Senna, praticante da natação.
Aliás, ao seguir a sua vocação náutica, o Tietê foi o primeiro clube da América do Sul a possuir uma piscina olímpica, em 1940, o que dá para mensurar a sua grandeza de outrora. Tal clube ostenta cerca de dois mil e duzentos troféus ganhos pelos seus atletas, em sua sala, para demonstrar que foi um clube vitorioso.
No meio da década de cinquenta, era famoso o seu show de "aqualoucos", que atraía e divertia um excelente público. A equipe do Tietê era liderada por um sujeito que posteriormente ficou famoso na TV e no cinema, como comediante, chamado : Ronald Golias...

As festas de Reveillon foram por muitos anos marcadas pela disputa com o rival, Espéria. À meia-noite, um clube queria superar o outro no show pirotécnico e quem ganhava era a cidade com esse espetáculo. Mas, com a decadência do rio, o clube Tietê também colocou-se a declinar. Não foi só esse o fator de sua decadência, sem dúvida, mas emblematicamente, o principal.
Hoje, o seu quadro associativo caiu drasticamente. Segundo apurei, não passam de mil e quinhentos associados (houve época em que passava de quarenta mil) e na faixa etária média de sessenta anos, sem perspectivas de renovação. A sua parte social que era super ativa, com festas; bailes; concursos de miss e shows musicais, acompanharam a decadência, infelizmente. E o golpe final veio do poder público : como encerra-se o período do comodato do terreno que pertence-lhe e ao considerar-se que o clube acumula dívidas de mais de quarenta milhões de reais com encargos atrasados, o despejo é inevitável.
Claro que sócios; ex-atletas e simpatizantes estão a protestar e comissões foram mobilizadas para apelar à prefeitura e até na câmara de vereadores, mas a decisão do poder público foi irreversível. A prefeitura de São Paulo pretende usar o equipamento do antigo Tietê para a formação de atletas. Menos mal que tenha esse plano e não o destrua simplesmente, para cedê-lo à sanha da especulação imobiliária. Porém, dói na alma ver um clube tão tradicional ser aniquilado dessa forma, sendo que muito de sua decadência deve-se à situação caótica do rio Tietê, portanto, culpa direta do descaso do poder público municipal e estadual, há décadas. Causa espanto e revolta entre seus atuais dirigentes o fato de que a prefeitura firmou acordo para rever o comodato de terrenos e renegociação de dívidas com oito clubes tradicionais da cidade, incluso gigantes envolvidos com o futebol profissional, casos como o do Corinthians; Portuguesa; São Paulo e Palmeiras e tenha mantido postura implacável contra o Tietê. Pode estar dentro da Lei, juridicamente a falar, mas não é nada justo, moralmente, o que está a acontecer com o simpático, Clube de Regatas Tietê.
Matéria publicada inicialmente no Site / Blog Orra Meu e republicada posteriormente no Blog Pedro da Veiga, ambas em 2012

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