terça-feira, 18 de junho de 2013

Miriam Batucada e o seu Samba Italianado - Por Luiz Domingues


O bairro da Mooca, na zona leste de São Paulo foi um dos que mais recebeu imigrantes italianos ao final do século XIX. É certo que os italianos espalharam-se também pelos bairros vizinhos, Brás;Belenzinho; Cambuci; Pari, e para ir além, perto do centro, a Bela Vista, apelidada como "Bexiga".


Contudo, na Mooca, pelo fato do bairro ter inúmeros galpões industriais, o contingente italiano tornou-se enorme, com essa massa de pessoas atraídas pelas oportunidades em termos de oferta de trabalho, que surgira na emergente indústria paulistana. 


Não demorou nem um pouco e a cultura italiana tornou-se uma marca registrada nesse bairro, ao imprimir usos e costumes, os mais variados. Naturalmente, os italianos a falar o nosso idioma português, mediante a presença de um fortíssimo sotaque, influenciou a forma em falar-se do paulistano de uma maneira geral, ao espalhar-se por toda a cidade. Dessa maneira, o modo para falar-se na Mooca, moldou a identidade paulistana, com o jeito m pronunciar-se o português, d uma forma totalmente "italianada". 


Foi através desse ambiente, que mais uma menina mooquense nasceu ao final de1946 (embora o seu pai só a registrasse oficialmente em 1947), chamada : Miriam Angela Lavecchia, que cresceu a falar com o típico sotaque do bairro. Segundo consta em sua biografia, ainda criança, aprendeu com uma coleguinha do bairro, a batucar com as mãos, ao estabelecer ritmos variados e com desenvoltura. Isso repercutiria decisivamente na sua vida adulta.


Quando "mocinha", Miriam fez um curso de digitação na IBM e conseguiu uma vaga para trabalhar em uma indústria de aparelhos eletrodomésticos. Entretanto, pouco tempo depois, foi demitida por um motivo insólito : quando digitava na máquina de escrever, batucava compulsivamente, ao irritar os colegas no escritório. Embrenhou-se então no mundo da música, e a sua incrível capacidade em tamborilar / batucar, ao usar somente as mãos, passou a chamar a atenção, isso sem contar com a sua extroversão e o jeito despachado, com aquele sotaque italianado, típico paulistano. E lógico, nessa altura o seu apelido já era Miriam "Batucada"...




Em 1967, ela obteve teve a sua primeira e grande chance. Em uma aparição na TV Record de São Paulo, encantou o público ao fazer a sua famosa batucada manual; tocar vários instrumentos e cantar os seus sambas, além de arrancar risadas da plateia e também do apresentador, Blota Júnior, por conta de suas piadas e jeito engraçado para expressar-se. Imediatamente, Miriam foi contratada pela TV Record e passou a figurar em vários programas musicais daquela emissora, que primava pela qualidade musical, naquela época. No ano seguinte, 1968, gravou então o seu primeiro compacto pela gravadora Rozemblit, com as músicas : "Batucando nas mãos" e "Plác-Tic-Plác-Plác".

A sua carreira prosperou em 1969 e 1970, ao torná-la uma figura folclórica do samba paulistano, ao transitar inclusive entre nomes da velha guarda, como : Adoniram Barbosa; Geraldo Filme; Germano Mathias, e os Demônios da Garôa. Em 1971, ela surpreendeu o seu público, ao unir-se com artistas de outro espectro muito diferente do seu, habitual. Ao lado de Sérgio Sampaio; Raul Seixas, e Edy Star, lançou uma espécie de disco / manifesto com teor "freak", chamado : "Sociedade da Grã-Ordem Kavernista". 
 


 

Muito cultuado por freaks, até hoje, esse disco destoou da carreira dela, pois o seu trabalho natural, projetara-se em meio a um samba bem tradicional, sem nenhuma ousadia estética. A seguir no embalo, Miriam Batucada lançou muitos discos com regularidade na primeira metade dos anos setenta, e sempre com o apoio do amigo, Raul Seixas. Porém, o tempo pôs-se a passar rapidamente e as oportunidades rarearam para ela. Com lançamentos mais espaçados, a sua carreira entrou em acentuado declínio, infelizmente. 
 



Mesmo assim, o seu último trabalho tornou-se um dos mais festejados pela crítica. O LP "Alma de Festa", de 1991, é considerado um de seus melhores trabalhos na carreira. Em julho de 1994, Miriam deixou-nos, e com ela, foi embora também, muito da alegria do samba italianado de São Paulo. A sua alegria; ginga; batuque manual inigualável, e sobretudo o sotaque ultra paulistano, deixou saudade.
 

Matéria publicada inicialmente no Site / Blog Orra Meu, em 2013

Nenhum comentário:

Postar um comentário