sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Cidade Dormitório - Por Luiz Domingues

Vivemos tempos difíceis no quesito da mobilidade urbana. Com as cidades cada vez mais inchadas, o trânsito caótico piora, para transformar a rotina dos trabalhadores, em um inferno cotidiano. Ações são discutidas por técnicos para melhorar o deslocamento das pessoas nas cidades, mas a complexidade de tal engenharia de trânsito, torna-se muito difícil em ser equalizada, quando na verdade, a realidade mostra-nos que na cidade de São Paulo, por exemplo, cerca de oitocentos novos carros são emplacados pelo Detran, diariamente...

Recentemente, eu li uma estatística a dar conta de que uma cidade do porte de Araçatuba (esta mantém-se na faixa de trezentos mil habitantes), desloca-se diariamente para São Paulo, que vem de cidades vizinhas, para trabalhar na capital. No Estado do Rio de Janeiro, é clássico o exemplo da cidade de Duque de Caxias / RJ, onde quase 90 % de sua população, precisa trabalhar na cidade do Rio, por falta de melhores opções de emprego.

Como se não bastassem todos os problemas, a questão política é um fator desanimador para quem sonha com dias melhores no trânsito. Interesses obscuros fazem com que as ações dos governantes não afunilem-se em torno de uma meta, e isso apenas gera mais frustração. Claro que o ideal é que cidades de mais de quinhentos mil habitantes contem com uma rede de metrô eficiente. Entretanto, o que observamos é uma ação de tartarugas para construir o metrô em poucas cidades e para piorar, de uma forma totalmente insatisfatória. Corredor exclusivo para ônibus, é um outro exemplo de necessidade para lá de urgente, com a possibilidade desses coletivos circular mais rápido, ao deslocar-se um número maior de pessoas, e assim retirar mais carros particulares das ruas.

Integração com trens de subúrbio e incentivo ao uso de bicicletas, também são importantes, com a ressalva de que no caso das bicicletas, a criação de ciclovias seguras, faz-se mister. Repensar a questão tributária dos taxistas, ao conceder-lhes melhores oportunidade em minimizar custos e por conseguinte, trabalhar com uma tarifa reduzida ao passageiro, é outra medida importante. Nesse caso, até a criação de uma tarifa especial de combustíveis, seria bem vinda e assim com a perspectiva do Pré-Sal, por quê não ? Tudo isso é discutido em profusão por vários setores da sociedade civil, ainda que o governo muitas vezes desconverse. No entanto, existe um outro elemento nessa equação, que seria vital para desatar esse nó cruel que atormenta milhões de pessoas : a questão da cidade dormitório.

A vida é cara e para poder arcar com a despesa de moradia, muitas vezes as pessoas precisam submeter-se a morar muito longe de seus locais de trabalho. Qual a lógica para morar-se em um determinado bairro e ter que deslocar-se com enorme sacrifício, para trabalhar em um outro bairro longínquo ? E o caso de pessoas que trabalham diariamente em outras cidades ?
Em uma estrutura social caótica como a do Brasil, tudo parece responder aos fatores aleatórios. A pessoa mora longe, porque não tem como manter-se em um bairro mais próximo do centro de sua cidade, e a questão do emprego é vista como um eterno "pegar ou largar", sem oferecer-lhe uma opção de escolha.

Dessa forma, criou-se essa caótica forma de deslocamentos, onde o que deveria ser o padrão, é tido como um golpe de sorte, para poucos e equivalente a tirar a sorte grande de um jogo de loteria. Trabalhar e morar no mesmo bairro, passou a ser um privilégio para afortunados, a caracterizar um mero fruto aleatório e produzido pelo fator da sorte. Pois os governantes deveriam consultar os urbanistas com maior atenção e repensar os seus conceitos. A geração de empregos a privilegiar trabalhadores do mesmo bairro, deveria ser plano de governo, como prioridade. Deveria ser tratada como meta de incentivo às indústrias; comércio; rede de serviços e outros empreendedores, no sentido de priorizar-se a contratação de profissionais do mesmo bairro de suas sedes. 

Se muitas pessoas passarem a trabalhar perto de suas respectivas residências, não será apenas o trânsito que irá melhorar.  É óbvio o benefício humano, com o aumento significativo da qualidade de vida. Ao tirar as pessoas do sufoco, em enfrentar a famigerada "hora do rush", sobra tempo para o lazer; cultura; tempo para viver com as suas famílias; prática de esportes etc. 

Não consigo imaginar o caos do trânsito melhorar, sem que os governantes trabalhem todas essas ações conjuntamente. Todavia, uma das mais importantes sem dúvida, é acabar com esse conceito de "cidade dormitório", onde o cidadão é massacrado por uma rotina de deslocamentos que antecipa-lhe a velhice em muitos anos, sob uma subtração desumana.

Matéria publicada inicialmente no Blog Planet Polêmica, em 2013.

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