quarta-feira, 2 de julho de 2014

Steve Jobs; Internet & Compartilhamento... - Por Luiz Domingues

Em meio à discussão acalorada sobre o marco civil da internet no Congresso Nacional, acho que vale a pena trazer à tona algumas considerações sobre o uso da rede livre de computadores. Para início de conversa, não é lenda urbana como alguns afirmam, que o conceito da Internet livre tem uma raiz muito forte no movimento Hippie, dos anos sessenta.

Muitos de seus idealizadores, foram Hippies de fato, e portanto bastante entusiasmados com conceitos de fraternidade, que eram típicos daquela filosofia de vida proposta por seus seguidores. Dentro desses parâmetros, um desses entusiastas das ideias fraternais propostas pelos hippies, foi um jovem chamado : Steve Jobs, que também mostrava-se apaixonado por tecnologia.

Ao final da década de sessenta, dois fenômenos aconteciam no estado da Califórnia : o movimento Hippie e o agrupamento de indústrias de tecnologia no Vale de Santa Clara, que ganhou por conta de tal fluxo, o apelido de : "Vale do Silício". Jobs transitava com entusiasmo entre os dois mundos e não é exagero dizer que muito de suas futuras realizações, foram profundamente influenciadas pelo fato de ter sido um hippie. Por ouvir com entusiasmo o som de Bob Dylan, o dia inteiro, ideias borbulharam em sua mente.

Foi à Índia, em uma típica incursão espiritualista que todo hippie potencialmente sonhava realizar, e travou contato com conceitos do Zen Budismo. A simplicidade e a bondade, como conceitos a serem adotados por toda a vida, fizeram-lhe bem. Claro que ele teve o seu envolvimento com as drogas alucinógenas, mas a experiência do "mind expansion" pareceu-lhe não ser o melhor caminho para atingir uma nova consciência, e criar-se daí, uma sociedade realmente fraternal. Abrir a mente e enxergar além, fora apenas um passo e pela indução das drogas, o estrago inerente causado como efeito colateral, não foi nada saudável (e de fato, foi fator preponderante para o declínio do movimento, infelizmente).

Houve pontos de divergência, é bem verdade. Hippies mais puristas, enxergavam os computadores como ferramentas de opressão da sociedade totalitária e consumista que abominavam. No entanto, é cabível considerar que ao final dos anos sessenta e início dos setenta, a internet mostrava-se restrita ao metiér das universidades e do serviço secreto governamental, portanto nem um pouco popular, e dessa forma, revelava-se nessa época, como algo a conter uma dose com carga antipática e assustadora, a serviço de forças realmente opressoras da parte de instituições governamentais. 

Abro um parêntese para recomendar um filme produzido em 1970, chamado "Collosus, The Forbiden Project" (leia resenha sobre tal filme, aqui em meu Blog 1 :

http://luiz-domingues.blogspot.com.br/2012/11/colossus-forbin-project-por-luiz.html

Esse filme retrata bem a maneira como os computadores foram vistos pelas pessoas naquela ocasião. Jobs conheceu outro hippie e gênio da tecnologia, chamado, Steve Wosniak, e dessa parceria resultaria a Apple, empresa por ambos fundada e que entraria no mercado para transformar o mundo.

Ainda em 1976, ele criou o primeiro protótipo de um computador para uso doméstico. Até a metade dos anos setenta, a imagem que as pessoas tinham dos computadores, era a de máquinas monstruosamente grandes, e circunscritas a salões enormes e cheios de técnicos a usar jalecos brancos e com pranchetas à mão, a estabelecer anotações indecifráveis.

A ideia em possuir um aparelho em casa, como um eletrodoméstico, parecia apenas um mero devaneio visto em filmes do gênero Sci-Fi ou mesmo do desenho animado futurista, "Os Jetsons", onde aliás, certas coisas que eram fantasiosas na época em que o estúdio Hanna-Barbera criou tais personagens, já são corriqueiras nos dias atuais e de certa forma até ultrapassadas na sociedade em que vivemos...

Em 1977, a dupla Jobs / Wozniak lançou o Apple II, o primeiro computador caseiro que apresentava imagens em cores. Já em 1980, a empresa dos "freak brothers" Jobs & Wosniak, continha um patrimônio orçado em dois bilhões de dólares, que era muito dinheiro para aquela época (e para a maioria dos pobres mortais, dos quais incluo-me, e na verdade, continua a ser muito dinhero...).

Por não parar em criar e ousar, vieram mais produtos e mudanças significativas que consolidou a empresa nos anos oitenta. A ideia do "mouse", por exemplo, que Jobs assumidamente disse ter concebido após conhecer as empresas de eletrônicos do Japão e o inerente conceito oriental de miniaturização. A nanotecnologia precisava ser dominada e incorporada ao produto.


Um paradigma foi o mote com o qual costumava trabalhar : "Invenção e Inovação = execução". Essa foi a diferença que transformava a ideia em realidade. E além de pequeno e usual, o produto tinha que ser simples em seu manuseio para o consumidor leigo, extrair todo o ranço criado no imaginário popular, sobre a máxima a dar conta de que somente os "cientistas" usavam computadores. Por sofrer pressões terríveis, Jobs deixou a empresa que fundara e criou a NeXT. Anos depois, a NeXT foi comprada pela Apple e Jobs voltou à empresa que fundara, agora a constituir-se em seu CEO.

A empresa teve um novo ponto de expansãoem termos de popularidade com a sua volta, pois Jobs tornara-se uma estrela do mundo corporativo, muito além do conceito do bilionário bem sucedido, mas principalmente pela imagem zen que trazia, ao contrastar com o executivo padrão, obcecado por dinheiro e nada sensível às reivindicações socioambientais. Pelo contrário, por ter a imagem de um Hippie desapegado dos valores materiais, Jobs criou um conceito para a empresa, de que ela era também engajada em tais ideais e que tudo girava em torno de conceitos de fraternidade; bondade e compartilhamento. Claro que não é bem isso, mas a imagem criada de uma empresa ao estilo "Hippie Chic", certamente amenizou a sua imagem e em comparação com outras mega empresas, é muito "menos odiada" por militantes socioambientais, ecomilitantes e anarquistas em geral, do que a Coca-Cola; Ford;, Disney; McDonald's, os Bancos e todo o pessoal de Wall Street, sem dúvida.

Em relação à Rede Mundial de Computadores, Jobs tinha em mente o conceito de "Empacotar a Internet", para distribui-la em cada lar. A ideia da internet ser livre, com o compartilhamento total de informações, fora o sonho hippie anti-establishment a  concretizar-se. 

De quem é o legado da civilização construída ao longo de séculos ?  Não é da humanidade ? Que descalabro é esse em ter que pagar para obter uma informação ? Pois é, o lado hippie de Jobs e Wosniak queria a internet livre, com cada cidadão a possuir o seu equipamento livremente em casa, para acessar à vontade.

Claro, o lado materialista tornou-se presente , também. A internet precisava ser livre, mas para acessá-la, você precisava ir à loja da Apple e comprar o seu microcomputador. E depois os acessórios; depois os programas; depois contratar a empresa provedora da banda larga etc...

Enfim, Hippie até a página dois do manual capitalista, mas convenhamos, melhor isso do que o modelo que as corporações desejavam / desejam, impor para a internet, ao fazer com que ela seja fatiada para eles poder explorar como as empresas de TV a cabo fazem quando vendem os seus "pacotes", ao fatiar as opções e assim fazer com que o consumidor pague o máximo para ter direito a todos os canais, quando moralmente a falar, a taxa mínima deveria dar o mesmo direito. Isso sem contar o famigerado "Pay-Per-View", que considero um mecanismo de achaque amoral. Se você já paga por um serviço, com que direito o seu fornecedor estabelece fragmentá-lo para criar patamares de cobranças adicionais, para só assim disponibilizá-los ? Com esse precedente abominável, o que falta para cobrar por um eventual,"pay-per-view advanced" ? Seria algo como : "não basta pagar a TV a Cabo para ver um jogo de futebol ao vivo, mas na verdade, você precisa comprar o Pay-per-view. Contudo, no "advanced", o consumidor teria que pagar uma terceira taxa, para liberar-se o sinal do segundo tempo da partida"...


É mais ou menos o que as corporações querem fazer da Internet e espero que os nossos parlamentares não cedam às pressões, mas ao falar realisticamente, com o dinheiro que está em jogo, alguém tem esperança que os "representantes do povo", pensem no povo, enfim ? Bem, Steve Jobs e Steve Wosniak ficaram conhecidos pela alcunha de Lennon & McCartney da informática. Há quem discorde e ache exagerado, mas sob uma primeira leitura, acho que tem uma similaridade, sim, e essa atribuída escala de valores, faz sentido. No tocante ao conceito de compartilhamento de informaçõe; cultura & afins, a internet nasceu fechada e secreta, mas graças aos hippies nerds que infiltraram-se nas universidades, o conceito Hippie de compartilhamento total, espalhou-se.

O que temos hoje em dia, é algo próximo do que os Hippies dos anos sessenta sonharam para o futuro da humanidade. Não é o ideal que desejaram, mas hoje a temos com concessões ao capitalismo selvagem de Wall Street e seus seguidores. Cabe à nós, usuários, pressionarmos os políticos a domar a sua sanha e das corporações, para não haver um retrocesso total e a internet tornar-se um império todo fatiado e inacessível para nós todos. Deixo a dica de um bom documentário que assisti, para entender um pouco melhor a vida e obra de Steve Jobs, chamado : "Steve Jobs, um Hippie Bilionário", que infelizmente foi retirado do You Tube por questão de direitos autorais, o que de certa maneira é contraditório ao espírito de Jobs e desta matéria, mas... assim é o capitalismo e a sua ode ao egoísmo e à ganância.
Para escrever esta matéria, tive o apoio da minha amiga, Jani Santana Morales, que deu-me valiosas dicas sobre Jobs e Wosniak. Agradeço-a efusivamente por isso.

Matéria publicada anteriormente no Blog Planet Polêmica, em 2014.

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