sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Marcos Rey, Escritor Maldito ? - Por Luiz Domingues


Livro é a base de tudo, quando falamos em educação, isso é inquestionável. Leitura é a mais eficaz forma de desenvolvimento do raciocínio; absorção de informação / cultura; capacidade cognitiva, e responsável por mais uma série de outros atributos.
Quando pensamos que no Brasil o livro não é uma prioridade, isso provoca-nos o sentimento ruim em sermos eternos inconformado com a falta de hábito do brasileiro em geral, em ler, e sobretudo pelo descaso das autoridades em fomentar tal hábito. Monteiro Lobato insistia nessa tese, também, e a sua frase famosa : “Um país se faz com Homens e Livros”, tornou-se lema de quem comunga desse ideal.

O que dizer então, diante desse panorama inóspito que a literatura tem neste país, onde um escritor que não obstante sofrer com essa situação do status quo reinante, ainda ostente sobre si, a pecha de “maldito”, ao ser perseguido e vilipendiado por detratores ? É o caso de Marcos Rey (pseudônimo de Edmundo Donato), um autor que foi bastante combatido e prejudicado por tal campanha agressiva da parte de quem o julgou sob preconceito, indevidamente. Nascido na cidade de São Paulo, no ano de 1925, Rey demonstrou talento nato para a escrita desde pequeno e de fato, aos dezesseis anos de idade, publicou no jornal, “Folha da Manhã”, o seu primeiro conto : “Ninguém Entende Wiu-Li”.

Com facilidade para aprender línguas estrangeiras, logo empregou-se para trabalhar com traduções para livros infantis, que garantiu-lhe o sustento, Bom com a caneta, também foi contratado para ser redator em estações de Rádio. Não tinha completado nem vinte e cinco anos de idade, e já era redator de uma emissora de porte como a Rádio Excelsior, e posteriormente transferiu-se para a Rádio Mundial. Com a chegada da Televisão no Brasil, o seu talento foi requisitado, assim como muitos profissionais que militavam no mundo radiofônico, e assim, Marcos foi ser redator de TV. Ainda no início dos anos cinquenta, ele lançou o seu primeiro livro : “Um Gato no Triângulo”.

Por acumular a função como redator de TV, com a de escritor, ainda achou tempo para ser publicitário, em uma época em que a propaganda televisiva penas engatinhava. Com o apoio de seu irmão, Mário Donato, fundou a Editora Mauá, que infelizmente não avançou como eles desejavam. Novos romances saíram : “Café na Cama”; “Entre sem bater”, “A Última Corrida”...

Mas foi em 1967, que a sua literatura começou a despontar para valer, quando lançou : “O Enterro da Cafetina”, e a seguir, em 1968, “Memórias de um Gigolô”.

Sucesso de público e crítica inicialmente, no entanto, também atraiu a atenção de setores conservadores da sociedade, que logicamente não apreciaram o apelo erótico embutido nas referidas obras. Daí em diante, Rey passou a colecionar opositores à sua obra, e o estigma adquirido como escritor “pornográfico”; “indecente”; ”devasso”, e / ou “imoral” , espalhou-se no imaginário do povo (fenômeno semelhante que ocorreria com a escritora Cassandra Rios, igualmente). Reforçou-se tal estigma quando ele foi requisitado para escrever roteiros para diversos filmes produzidos no polo cinematográfico espontâneo da chamada, “Boca do Lixo”, e contribuiu bastante para a produção das ditas “pornochanchadas”, filmes populares com humor e erotismo, que chocavam as camadas conservadoras da sociedade no início dos anos setenta, mas que vistos hoje em dia, tais obras são verdadeiros pastelões popularescos, e não muito diferentes do humorismo que vê-se na TV atual.

Outra vertente que Rey desenvolveu foi a dos romances policiais. Em países como os Estados Unidos; Inglaterra e França, onde tal gênero literário é normalmente muito admirado e consumido, não há nenhum preconceito sobre ele, e pelo contrário, são bastante admirados. O diretor de cinema, Alfred Hitchcock , costumava recorrer a esse tipo de literatura ao pesquisar novas histórias para roteirizar e filmar.

Aliás, é desse tipo de literatura que baseou-se uma das mais belas escolas estéticas do cinema norteamericano, o chamado : “Cinema Noir”, dos anos quarenta, e que respingou também no cinema inglês, e no francês, via “Nouvelle Vague”, anos depois. Entretanto, aqui no Brasil, infeliz e injustamente, a literatura policial mantém o estigma em ser uma literatura menor, com baixa qualidade.


Claro que eu não compactuo com tal conceito, mas para muita gente, os romances policiais de Marcos Rey ficaram marcados por tal ideia. "Maldito” para muitos, genial para outros, Marcos Rey seguiu a sua vida como escritor; redator de TV; roteirista de novelas; mini-séries; filmes, e tornou-se também colunista de uma revista de circulação nacional e com porte, como a "Veja", a partir de 1990. Três de seus livros tornaram-se filmes ("O Enterro de uma Cafetina", que lembra muito o estilo cinematográfico da Comédia Dell’arte italiana; “Memórias de um Gigolô”, e “Patty, a Mulher Proibida”, baseada no conto “Mustang Cor de Sangue”), e no caso de “Memórias de um Gigolô”, houve também uma versão para a TV, como mini-série.



Apesar do vilipêndio de uma parcela do público, Marcos Rey ganhou prêmios literários, como o famoso “Jabuti” e o “Juca Pato”.
Muito identificado com a cidade de São Paulo, a maioria de seus livros tem a capital paulista como cenário e personagem implícito.  Eminentemente um autor urbano, foi um dos maiores tradutores do frenesi paulistano. Escreveu mais de quarenta livros, e além dos que já citei anteriormente, vale a pena lembrar de outros tais como : “O Pêndulo da Noite”; “Ópera de Sabão”; “Soy Loco por ti, América”, “Último Mamífero do Martinelli”; “A Arca dos Marechais”; “Malditos Paulistas”; “Esta Noite ou Nunca”; “Um Cadáver ouve Rádio”, “Na Rota do Perigo”, e muitos outros.

Marcos Rey deixou-nos em 1999, e para atender o seu pedido, a sua viúva espargiu as suas cinzas pelo centro da cidade de São Paulo, diretamente de um voo de helicóptero.

Marcos Rey é mais um exemplo de artista que produziu muito, mas não tem o reconhecimento devido que sua obra merecia ter.

Matéria publicada inicialmente no Site / Blog Orra Meu, em 2014

2 comentários:

  1. Lindo post!
    Livro é a base de tudo na sociedade!
    parabéns ao meu amigo MARCELINO, eu o conheço!!!!(virtualmente)
    FELIZ NATAL!
    http://www.elianedelacerda.com

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    1. Muito obrigado pela sua participação sempre bem vinda, amiga Elyane.

      Como escritora e agitadora cultural que é, claro que o assunto lhe desperta o máximo interesse e não seria de se estranhar, logicamente.

      Sim, eu sei que conhece, e já entrevistou o nosso amigo em comum, o Marcelino Rodriguez, que aliás, é um escritor sensacional, e mereceu todo o apoio que você lhe deu no seu Blog super bacana.

      Que em 2015, seu Blog continue prosperando, cada vez mais !

      Excelente Natal e próspero Ano Novo, amiga !!

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